Uma coisa que eu amo fazer é conhecer mulheres que deixaram o Brasil e resolveram viver a vida em outro canto do mundo. E esse artigo traz uma entrevista com a expatriada que atualmente vive na Áustria, Ana Dietmuller, que nos conta sobre todo esse processo de mudança para a Europa.
DP: Ana, conte um pouco sobre você, família, idade, de onde você é no Brasil?
Meu nome é Ana Brígida Rezende Mazzarolo Dietmüller, sou casada com um europeu, mãe de um pequeno de 6 anos. Tenho 45 anos, sou nascida e criada em Porto Alegre. Formei-me em Direito e trabalhei como advogada corporativa, por 15 anos, enquanto morei no Brasil.
DP: E como surgiu a Áustria na sua vida? Como foi parar aí?
Minha troca de continente se deu por conta de haver conhecido meu marido, que é austríaco, ainda no Brasil. Abriu-se, para ele, uma possibilidade de retorno. Então, 3 aviões e 4 malas depois, descíamos na Áustria – no ano de 2012 – onde moramos até hoje.
DP: Que aventura! E seus maiores desafios, barreiras a serem quebradas com todo esse processo de mudança de vida e país? Quais foram/têm sido? Precisou se reinventar muito?
Uma mudança de bairro já traz alguns impactos. Imaginem uma mudança de país, de continente, de hábitos, de língua, de paisagem, de temperatura, de modo de vida!
A língua, que eu nunca havia aprendido até chegar em Viena; a forma de pensar do povo, que é bastante diferente do nosso modo brasileiro; a gastronomia, um universo a parte e totalmente diverso do que estamos acostumados.
Um dos meus primeiros desafios foi me acostumar a ter segurança, a não desconfiar das pessoas na rua; a não desconfiar de quem andava na mesma calçada que eu. Seguido me pegava passeando, grudada à bolsa. Hoje, ando tranquila com a bolsa virada para trás de mim. Vencida essa etapa, o segundo maior desafio foi aprender a ser dona de casa, a passar por uma gravidez, tendo apenas o marido como apoio, e a ser mãe sem familiares por perto.
Agradeço todo o apoio de minhas primeiras amigas na Áustria, Sabina e Ingrid. Pois sem conexões, seria muitíssimo mais difícil. E meu esposo foi primordial, garantindo-me uma transição e uma gravidez harmoniosas e com o mínimo de stress possível.
Sempre gostei de multiculturalidade e nunca fui uma pessoa introvertida, então, mesmo com pouquíssimo alemão, eu ia me apresentando às situações e lidando com elas da melhor maneira que eu – até aquele momento – conseguia.
DP: De que forma você se preparou para essa mudança? Pesquisou antes sobre o lugar, contactou brasileiros que vivem no lugar, buscou informação nas embaixadas?
Não houve muito tempo de preparação para a mudança. Pois em um período de menos de um mês, meu marido recebeu a oferta de trabalho e a data para partirmos.
O conhecimento de Áustria que eu tinha, vinha dos livros de História, das valsas de Strauss, da erudição de Mozart, do passado – infelizmente – nazista, e da nossa Imperatriz Dona Leopoldina, austríaca “da gema”. E foi com esse conhecimento que eu atravessei o oceano. Havia um facilitador, no meu caso, que era meu marido.
Quando se vem com alguém do país, o choque é suavizado, mas continua sendo choque, porque é necessário colher as próprias impressões e não apenas viver daquilo que se ouve.
DP: E o que você faz hoje onde vive? Empreende, continua com o mesmo cargo do Brasil?
Logo que chegamos, providenciei o reconhecimento de meu diploma de graduação e pós-graduação em Direito. Naquela época, 2012/2013, correu tudo muito rápido e, em um período de 3 meses – entre o protocolo dos papéis até o reconhecimento – estava tudo chancelado pelo governo.
Eu estava apta a trabalhar como consultora jurídica, mas não como advogada. Pois para advogar em solo austríaco eu teria de passar pelo equivalente ao nosso Exame de Ordem e comprovar um número “X” de atividades práticas exigidas pela autoridade de ensino jurídico local.
Optei por permanecer como consultora em um primeiro momento, pois, para toda a empreitada, eu teria de cursar a faculdade novamente aqui e, para isso, eu precisaria do alemão proficiente, o que estava longe de ser o caso quando do reconhecimento do diploma.
Após a gravidez, gozei 2 anos de licença-maternidade (garantidos por lei a todas as mães que dão à luz em solo austríaco e estão devidamente documentadas). Mas como meu marido viajava a Europa inteira a trabalho, eu ficava totalmente sozinha com o pequeno.
Não era, portanto, cogitável tentar me lançar ao mercado de trabalho sem ter com quem deixar nosso pinguinho. Nesse meio tempo, para manter minha capacidade intelectual ativa, engajei-me, através da escrita, ao Brasileiras pelo Mundo (site dedicado a publicar as experiências da vida de mulheres brasileiras que moram ao redor do Globo) e à Rebrinc (Rede Brasileira Infância e Consumo).
E, entre administração de casa, fralda, material de escrita, noites mal dormidas, resolvi escrever um livro, “Histórias de Morar Fora”, contando a experiência dos meus primeiros anos morando aqui. Hoje, nosso pequeno já está na primeira série e meu marido não mais viaja pela Europa.
Tempo propício a se buscar uma posição no mercado de trabalho. Não foi nada fácil, mas por intermédio de um dos cursos que a Agência de Empregos Austríaca recomenda, abriu-se a oportunidade de um estágio e, do estágio, um treinamento de trabalho na minha área: atualmente, desempenho a função de jurista em uma organização que presta assessoria jurídica a refugiados e imigrantes.
Melhor, impossível! Além disso, como forma de retribuir ao país um pouco do que ele me proporcionou, engajei-me também como voluntária na Cruz Vermelha, trabalhando, atualmente, com a Terceira Idade e com a juventude.
DP: Impressionante sua capacidade de se reinventar ao longo desses anos! Que diferenças culturais mais te chamaram a atenção quando se mudou?
A primeira delas foi a confiança das pessoas. Ninguém desconfia de ninguém a menos que haja, realmente, um motivo para tanto. Aquilo que é prometido é cumprido e, talvez, o maior choque: aprender a ouvir e a dizer não.
O nativo não tem medo de dizer que não pode fazer tal coisa, que não pode ir a tal lugar, que não gosta disso ou daquilo. A um primeiro momento, para uma brasileira recém-chegada, soava meio grosseiro, mas dentro do contexto cultural deles, não é. É a maneira como eles lidam com o dia a dia. Se não dá, não dá. Não insista, nem diga algo apenas para agradar. Hoje, eu sou adepta, faceira, do “não”.
DP: E que dicas ou mensagem você deixaria pra quem pretende começar uma nova etapa da vida como expatriada?
Jamais julgue a cultura, os hábitos, o jeito de ser do novo país apenas porque você veio de outro lugar e no outro lugar “não se faz assim”. Não tente impor a sua cultura apenas porque você é novo/a no pedaço. A riqueza da experiência de se viver fora reside na troca respeitosa de cultura, de tradições, de culinária, de histórias de família entre você e os habitantes de seu novo lar.
Não mude sua essência, não esqueça suas raízes, mas conserve sua mente sempre aberta para avaliar o novo e decidir, consciente, se ele lhe serve ou não!
Até a próxima! E obrigada de coração a Ana pela sua generosidade em compartilhar conosco sua história!
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Sou Debora, carioca de Niterói e moro na Croácia. Trabalho como produtora de conteúdo e redatora em redes sociais, sites e blogs. Sou também professora de línguas (inglês e português para estrangeiros) e tradutora EN-PT).
Antes dessa mudança total em minha vida de expatriada, trabalhei como professora de inglês em diversas escolas de línguas no Brasil e também em empresas com a Petrobras e Vale do Rio Doce. Fui recepcionista bilíngue em eventos voltados a plataformas de petróleo e gás. Viajei o mundo e conheci os 5 continentes e mais de 60 países, a bordo de navios de cruzeiro da empresa Royal Caribbean, onde era recreadora infantil.