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Como é dirigir na mão inglesa

Última atualização do post:

Dirigir na mão inglesa
Tradicional ônibus inglês de dois andares - Photo by chan lee on Unsplash

Precisei ir ao centro de Londres esta semana mas, para não pagar a congestion charge (taxa de 15 libras por dia para carros não elétricos circularem na área central), usei um dos famosos ônibus vermelhos de dois andares. Por sorte os assentos mais disputados estavam vazios e eu me sentei no primeiro banco do segundo andar. Impossível não me imaginar em um passeio turístico pelas ruas da capital inglesa com aquela vista.

Dirigir na mão inglesa
Tradicional ônibus inglês de dois andares – Photo by chan lee on Unsplash

Claro que eu, com minha mentalidade de brasileira expatriada que ainda não se adaptou completamente às conquistas do primeiro mundo, notei que o motorista do ônibus era, na verdade, a motorista. Uma mulher jovem, usando véu e óculos escuros e, além disso recebia cada passageiro com um sorriso lindíssimo. Senti um orgulho anônimo ao perceber que ela dirigia com confiança e naturalidade aquele veículo enorme. Primeiro por ser mulher, depois, porque também sou motorista e enfrento o tráfego londrino, e o preconceito masculino, diariamente.

Tirei minha primeira habilitação no Brasil em 2000 e, desde então, o único período que fiquei sem dirigir foi quando me mudei para Londres. No primeiro ano eu estava em processo de adaptação, pois não dominava o idioma e precisava resolver questões de documentação para poder trabalhar. Feito isso, comecei a estudar para fazer o teste teórico que seria extremamente difícil. Não apenas por ser em inglês, mas principalmente porque é feito de forma interativa, ou seja, você e o computador apenas.

Testes teórico e prático  

Minha vontade de dirigir em Londres era tanta que estudei duas horas consecutivas todos os dias durante um mês. Certamente não seria exagero dizer que eu decorei todas as respostas do DVD. O teste teórico é composto de 50 questões, das quais eu precisava acertar 43 para ser aprovada. Acertei 48. Depois vieram as aulas práticas e o desafio de dirigir na mão inglesa pois, apesar dos meus dezessete anos de estrada, eu não me sentia nada segura para dirigir “na contramão”. As primeiras aulas foram uma mistura de suspense e comédia. Eu não conhecia as ruas e, portanto, não sabia se haveria espaço para passar com o carro, já que o sistema de estacionamento inglês não segue as mesmas regras do Brasil e as ruas são extremamente estreitas.

O instrutor chamava minha atenção para os “vícios” que eu precisava corrigir o tempo todo, o que resultava em frustração e crises de choro no banheiro. No final da sexta aula eu tinha certeza de que não seria capaz de dirigir na mão inglesa nem que pagasse por mais vinte horas de aula. Meus ombros doíam de tanta tensão e eu havia machucado minha mão quando, pela centésima vez, tentei trocar a marcha do lado direito e acertei o vidro da janela do carro.

Naquela noite conversando com meu filho adolescente sobre como era difícil lembrar de usar a mão esquerda ele me disse: “Lembra quando eu era pequeno e a senhora me ensinou direita e esquerda amarrando uma fita no meu braço?” Eu não amarrei uma fita, mas escolhi uma pulseira cheia de miçangas para usar no braço esquerdo. Foi como mágica. Não errei uma única vez!

Tempo de carteira e acidentes versus valor do seguro

Em abril de 2018 fiz o teste e passei de primeira. Recebi minha carteira e comecei a trabalhar com entrega. Um mês depois me envolvi em um pequeno acidente. Em junho meu marido sofreu um ataque cardíaco e faleceu (vou falar sobre isso no próximo artigo). Passei quase três meses no Brasil e, quando voltei para Londres, descobri da pior maneira possível como a indústria do seguro funciona na Inglaterra.

Eu pagava o seguro mensalmente, através de débito automático. O valor era alto porque minha carteira era nova. Quando o outro motorista entrou com pedido de cobertura dos gastos dele, a seguradora descontou da minha conta o valor total do contrato, que era de um ano e, para completar, cancelou o seguro. Quando tentei renovar o valor ficou impraticável e optei por vender o carro. Agora eu tinha a carteira, mas não tinha carro.

Dirigindo na direção do meu sonho

No início de 2019 eu estava trabalhando meio período como auxiliar administrativa para uma empresa que vende peças de carros quando surgiu uma vaga no setor de entregas e eu voltei a dirigir em Londres. Primeiro fazendo entregas locais, depois me aventurando por bairros distantes e até cidades vizinhas.

A indústria automobilística ainda é um setor predominantemente masculino no mundo todo, e isso se reflete no número de cargos ocupados por mulheres dentro da empresa (no meu caso 2 de 20), bem como nas funções exercidas por elas (auxiliar administrativo e limpeza). Eu costumava ver isso como machismo ou opressão cultural, mas depois de tentar mover um tonel de óleo de 50 litros, entendi que existem diferenças biológicas irreconciliáveis entre homens e mulheres.

No entanto, existe muita oferta de emprego na área, pois a economia londrina é completamente dependente da movimentação de bens e pessoas.

É trabalhando como motorista, dirigindo em Londres, que eu sustento minha casa e invisto no meu sonho: ser uma escritora. Nas horas vagas dirijo meu carro pelo simples prazer de me sentir livre, mesmo pressa no interminável tráfego londrino. Afinal, aprendi como dirigir na mão inglesa!

Dirigir na mão inglesa
Dirigindo em Londres – arquivo pessoal

Se você também quer dirigir em Londres, o site para aplicar é esse do governo: Gov-UK

Leiam aqui outros textos da autora

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Isabel Brambilla

Sou paranaense, expatriada em Londres desde 2016. Bahcarel em Turismo por formacão, administradora de profissão e escritora por amor. Apaixonada por livros, viagens, fotografia, artesanato, jardinagem e camping. Mãe orgulhosa de um adolescente e namorada de um verdadeiro lord inglês, com quem estou descobrindo a ilha da Rainha. Para acompanhar minhas aventuras pela Inglaterra me sigam no Instagram.

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