Eles crescem e a gente sabe. A vida toda sabemos que esse momento chegaria. Mas quando chega, dói. Dói de um jeito silencioso, sofisticado, quase invisível aos olhos de quem está de fora. Você sorri, incentiva, faz as malas junto, diz que é “incrível essa oportunidade”, e é mesmo. Mas quando o portão do embarque fecha e aquele filho de 20 e poucos anos atravessa o mundo para estudar em outro país, é como se um pedaço do seu coração se levantasse e partisse com ele.
Hoje, com 55 anos, vivendo minha reinvenção em Portugal, percebo que viver um recomeço enquanto meu filho também vive o dele, nos bagunça por dentro. A distância entre pais e filhos expatriados é mais do que física: é também emocional, é de maturidade, de fases de vida diferentes que se desenrolam ao mesmo tempo, e que exigem uma nova forma de se relacionar. Duas vidas em transformação, dois caminhos paralelos que, apesar da distância física, precisam seguir conectados pelo coração, pelo cuidado, pela escuta — mesmo que silenciosa.
O novo papel dos pais de filhos expatriados
Ninguém prepara a gente para aquela mensagem que não chega ou para a vídeochamada, onde você vê no rosto do seu filho que não está tudo tão bem assim, mesmo ele afirmando que sim.
Nós, os pais, temos que aprender a viver um novo papel. Um papel que acolhe, mas não sufoca, que observa, mas não controla. Que ama de longe, mas às vezes precisa intervir, porque o amor de verdade sabe a hora de conversar, de puxar pela escuta e até de ser firme, quando percebemos que a imaturidade das escolhas está colocando a felicidade deles em risco. Não se trata de invadir, trata-se de proteger com presença, com palavras, com cuidado. Estar longe não significa se omitir

Desafios em duas pontas: quando mãe e filho recomeçam juntos
Meu filho tem 21 anos e foi estudar fora. Eu, com 55, também estou me reinventando, morando em outro país. Dois recomeços e dois mundos diferentes. Mas um mesmo desafio: viver o novo sem saber tudo, com medo, mas com coragem.
Ele tenta se adaptar à nova cidade, cultura e idioma com a impulsividade de quem está descobrindo. Eu tento me adaptar à minha nova rotina, identidade e forma de estar no mundo. Tento me adaptar com a calma inquieta de quem precisa abrir espaço para o que ainda não conhece.
A gente compartilha dúvidas, silêncios e risos nervosos. Às vezes ele some por dias, mas às vezes sou eu quem me recolho. Contudo, estamos conectados e isso não é só pela Internet, é pelo coração.
Ele com a juventude e a impulsividade e eu com a maturidade e a responsabilidade.
Ele lidando com o novo sem experiência e eu lidando com o novo com o peso da experiência. Somos dois seres humanos em transição, cada um tentando se encontrar em um novo lugar — ele, literalmente. Eu, internamente.
Conexão emocional: mais do que Wi-Fi, é presença real
É claro que a tecnologia ajuda. A videochamada salva. A mensagem no grupo da família traz aquele suspiro de alívio. Mas a verdadeira conexão vai além do online. Ela se constrói no olhar atento, no sentir à distância, no respeitar o silêncio quando o filho não responde — porque às vezes, o silêncio é um pedido de ajuda disfarçado de “não quero incomodar”.
Muitas vezes, o que parece frieza ou distância é só confusão, é o jovem tentando se provar forte, maduro, pronto. Mas a verdade é que a geração deles, apesar de cheia de informação, cresceu com pouca vivência prática. Foram protegidos, entretidos e cercados de cuidados e agora precisam, de uma hora pra outra, virar adultos funcionais, em outro idioma, outra cultura, outro ritmo.
“Tá tudo bem, mãe.” Mas o olhar diz que não. O tom de voz entrega o cansaço, a solidão, o medo de falhar. Nossos filhos cresceram com tecnologia, com distração, com rapidez. Sabem mexer em qualquer aplicativo, mas muitos não sabem resolver um problema no banco, cozinhar, lidar com a frustração. E não é culpa deles. É parte do tempo em que vivemos.
E é aí que a gente entra. Com escuta, intuição e acolhimento. Não para resolver, mas para segurar emocionalmente. Não com julgamentos, mas com presença. Com maturidade. Com empatia. Para ser aquele porto seguro silencioso que, mesmo longe, está sempre de braços abertos. Para dizer: “você não está sozinho”.
Mostrando que crescer é desafiador, sim — para eles e para nós também.

Os filhos expatriados precisam aprender, mas não sozinhos
Essa é a parte mais difícil para nós: deixar que nossos filhos quebrem a cara. Que sofram, que se frustrem, que aprendam a pedir ajuda. Sentir saudade. Tem uma parte de nós que quer resolver tudo. Mandar dinheiro, fazer ligação, buscar solução.
Mas filhos expatriados precisam viver o desconforto de não saber como agir. Na verdade, jovens adultos precisam vivenciar isso. É nesse espaço que nasce a autonomia e nesse vazio é que eles desenvolvem força. E a nossa missão não é preencher esse espaço, mas estar ali, firme, de mãos abertas, prontos para acolher sem julgamento.
É preciso ensinar a pensar. Ensinar a fazer. E ensinar que está tudo bem pedir ajuda. Que ninguém nasce sabendo viver a vida — a gente aprende no caminho. É dia a dia, passo a passo, vivendo, fazendo, para no caminho ir aprendendo e descobrindo, e com isso construir um alicerce forte.
Além dos filhos expatriados, nós também estamos aprendendo a viver
Eu também estou em processo. De desapego, de reconstrução, de reinvenção.Tentando entender que presença não se mede em quilômetros. No processo de aceitar que o silêncio também pode ser um elo.
Descobrindo que crescer junto é possível — mesmo que cada um esteja em um país.
Porque nossos filhos precisam ver que crescer não tem idade. Que eles não estão sozinhos nessa sensação de incerteza. E que somos, além de pais, pessoas reais, com medos, recomeços e vontade de acertar.
Nesse processo, entendi que não basta torcer para eles darem conta. Precisamos criar espaços de conversa real. Não da mãe que dá sermão, mas da mulher que compartilha que também está com medo, que também está aprendendo. Porque nossos filhos precisam ver que crescer não tem idade. Que eles não estão sozinhos nessa sensação de incerteza.
Portanto, esse ponto de conexão é ouro. É ele que cria um relacionamento adulto entre pais e filhos. E, mais do que nunca, é isso que nossos filhos expatriados precisam: sentir que podem ser eles mesmos com a gente — mesmo distantes.

A nova missão dos pais: ensinar a viver, não a sobreviver
Nossa geração teve que ralar muito, pois fizemos muito com pouco. Crescemos com menos recursos, mais responsabilidades e menos acolhimento emocional. Por isso, tentamos dar aos nossos filhos tudo o que não tivemos.
Entretanto, talvez, no caminho, tenhamos poupado demais. Demos conforto, informação, segurança. Mas tiramos deles algo precioso: a prática de viver. Nós aprendemos a experienciar as coisas, usando a mente, a intuição e a razão. Nossos filhos acabaram vivendo muito na mente, no digital e no mundo imaginário, e talvez, isolados de si mesmo. Proteger virou excesso. E excesso virou despreparo.
Vivemos cercados de jovens que sabem tudo de redes sociais, mas não sabem fazer um arroz. Falam inglês fluente, mas não sabem ligar para resolver um problema no banco. Estudam em universidades internacionais, mas não sabem lidar com um coração partido ou um não na entrevista de emprego.
E é aqui que entramos. Não para julgá-los. Mas para guiá-los. Com amor, escuta e paciência. Presença real, mesmo que virtual. E, principalmente, com o compromisso de não sermos perfeitos — mas de sermos humanos, acessíveis e inspiradores.
Reflexão final: estamos prontos para crescer com eles?
Ter um filho expatriado é uma montanha-russa emocional. Dá orgulho, dá medo, dá saudade. Mas também é uma chance de crescer junto. De evoluir como mãe, como pai, como ser humano.
Eles estão tentando se encontrar no mundo. Nós, tentando nos reinventar depois dos 50. Talvez nunca estivéssemos tão parecidos. Por isso, deixo aqui uma pergunta para você:
👉 Você está disponível para crescer com o seu filho?
Porque se tem uma certeza nessa vida, é que presença emocional não tem fuso horário. E conexão verdadeira não depende de endereço.
About The Author
Cristiane Andrade
Empreendedora, mentora e expatriada apaixonada por compartilhar experiências de vida e negócios.
Depois de anos construindo minha trajetória no Brasil, tomei a grande decisão de recomeçar em Portugal. Aqui no Diário de uma Expatriada, compartilho os desafios, aprendizados e emoções dessa transição, sempre com um olhar autêntico e inspirador.
Acompanhe essa jornada e descubra como é possível transformar mudanças em novas oportunidades!
📩 Me siga no Instagram crisandrade.contadora para mais histórias e reflexões sobre a vida de uma expatriada.