No final de agosto de 2021 trocávamos a vida em terra pela vida no mar. Chegávamos em nosso veleiro no centro do litoral da Croácia. Desde então estamos: acordando quando o sono acaba; passando por lugares lindos; se surpreendendo com os detalhes ao nosso redor; observando as estrelas; nadando quando o desejo bate e descobrindo coisas que nos agrada que nem sabíamos de sua existência.
Durante o mês de setembro velejamos pelo norte e centro da Croácia. Saímos de Split em direção ao parque nacional Krka, ao norte, mas em um veleiro o que vale é parar em cada baía que se encontrar pelo caminho. E como a geografia da Croácia nos presenteia com uma baía, seja em continente ou ilha a cada milha. Nos deleitamos parando em pequenas cidades ou em baías completamente selvagens.
Foi incrível! Cada lugar que conhecemos e passamos, a natureza não economizou na exuberância e beleza. E começamos a entender os sinais da natureza, um vento que muda de direção e logo tem uma nuvem se formando; é uma tranquilidade que prediz a ventania ou a mudança das nuvens no céu a avisar a temperatura do próximo dia.
Pausa para as particularidades da vida a bordo
Antes de cada ancoragem é preciso analisar alguns critérios como:
- o fundo – se é bom para prender (unha) a âncora;
- a profundidade – se há corrente suficiente para chegar até o fundo e ainda segurar o barco. Ou ainda, se não é raso ao ponto de bater o fundo do barco (quilha);
- a proteção dos ventos – se o vento que está previsto entrará e como na baía;
- o mar – como é o movimento das ondas (swel);
- o tamanho da baía – se com o movimento do barco é possível encostar nas margens ou em outro veleiro.
Tudo isso pode interferir se o barco ficará ou não “parado” (um veleiro na âncora nunca fica parado completamente, ele vai girar sob a âncora procurando ficar de frente – aproado – para o vento e balançar conforme a maré) e seguro. Quando uma dessas coisas não acontece é um verdadeiro barata voa e o trabalho de reancorar, mas esse “causo” fica pra uma outra vez.
Outro detalhe interessante é que para chegarmos até a costa, seja uma cidade ou uma praia, usamos um bote inflável com motor de polpa. Já que ancoramos uma certa distância da costa o passeio de bote é uma diversão a parte e as crianças estão aprendendo a pilotá-lo. Mas nossa locomoção por terra no verão fica mesmo por conta do transporte público e por belas caminhadas.
Maas, nem tudo são flores ou mar calmo
Não é nossa primeira grande mudança, então estávamos preparados para vida chegar depois das malas. Pois sabiamos que a sensação de férias perdura por um tempo, só não esperávamos que a liberdade fosse tão perturbadora. As crianças em homeschooling e eu em homeoffice descobrimos que nossa experiência de pandemia não tem relação com essa nova vida.
Agora temos que adaptar nosso calendário aos roteiros de velejada e isso significa não usar o calendário de 5×2 dias que estamos tão acostumados. É muitas vezes, abrir mão do ideal (que ainda está contaminado com a forma de vida em terra) e fazer o que é possível.
Nesses processo de ajustes, descobrimos que dias de velejar é só pra velejar. Além disso, nem sempre é possível programar antecipadamente o dia para velejar, como estamos a mercê das mudanças climáticas, por vezes, é preciso mudar de ancoragem para nos esconder da ventania ou da tempestade. E que seguir uma rotina com tarefa divididas por dias da semana é tão dificil quanto negar o convite da vida ao redor.
Então começamos a nos desapegar do calendário. As crianças escolhiam 3 matérias para fazer durante a semana. Eu organizei meu trabalho em tarefas para a semana (não passando de 4) e on-line síncronos para um dia na semana. Foi manejável e eu diria que até tivemos sucesso se não fosse a sensação de estar devendo.
Tempo, tempo, tempo
É impressionante como esse sistema de tempo à que fomos moldados impregna e nos trava. Por um bom tempo me senti improdutiva e fazendo menos do que eu deveria ou poderia, afinal agora eu tinha TEMPO! Tempo de sobra para me dedicar aos meus projetos. Mas, e a vida pulsando e se movimentando ao meu redor também demandava TEMPO!! Tempo de observação, de espera, de contemplação e assimilação.
Mas o que me deixou alerta nisso tudo foi perceber que meu filho de 11 anos também estava compartilhando da mesma sensação, de perda de tempo ou de não estar fazendo o suficiente. O que estamos ensinando, enquanto sociedade, para nossas crianças? Que tarefas são essas tão importantes e inadiáveis, que uma criança precisa fazer? Que futuro é esse tão precioso que nos impede de apreciar o presente?
Até a próxima ancoragem e com mais novidades sobre a nossa vida a bordo.
Beijos
Olá! Sou fonoaudióloga da primeiríssima infância, mãe do Giovanni de 11, da Manuela de 9 anos e casada com o Tiago. Tenho espírito nômade, adoro o contato intenso com a natureza, ouvir e contar histórias. Acabamos de mudar para um veleiro de 39.3 para conhecer o Mediterrâneo e a vida de um modo diferente.
Respostas de 13
Mariana, que legal! Parabéns pela família e pela coragem.
Abraço forte!!!
Oi Josi, obrigada!
Beijos
Sensacional! Parabéns pela coragem! Beijo
Querida Mari que delícia te ler. Aqui eh a Débora psico da Dibel. Desejo muitas alegrias em tua vida minha querida!Bjs
Oi Débora!!! Que bom te encontrar por aqui. 🙂
Adorei,estou feliz por vcs , se passar por Portugal ,vem me dar um bj vou amar ,amo vcs que Deus os proteja sempre bjsss
Pode deixar que te aviso quando chegarmos em Portugal. Bjs
E muito interessante tudo o que você descreve. Nunca imaginei ter uma família que gostasse de tais aventuras. Estou adorando ouvir/ler tudo isso.
Muito bom o seu relato Mariana. Principalmente acerca da noção do tempo e como usá-lo. Obrigado por compartilhar. Bons ventos família.
Que aventura Mari e que delícia!!
Adorei ler suas vivências e o quanto estão construindo memórias significativas na vida em família!
Parabéns pela coragem !!
Um grande beijo querida e a benção e proteção de Deus a vocês !
Oi Mari!! Lindo relato! Que experiência incrível pra vida vcs estão vivendo!!Vc está indo longe mesmo!! Bjs grandes
Oi, Mari, sensacional essa forma de viver onde cada momento se torna uma história e aprendizado para a vida.
Gostei de ler! Sempre resolveram passar o Inverno em Brindisi? Saúde e Boas navegações!