Num dicionário, a palavra Expatriada estampada: “pessoa que foi obrigada ou não a viver fora de seu país”.
Todavia, no meu caso que estou fora do Brasil há 17 anos, não senti essa mudança como uma obrigação, acho que sou expatriada por vocação. Definiria essa palavra como: “pessoa que decide viver fora do seu país à procura do desconhecido”.
A princípio, comecei a querer ser expatriada antes mesmo de fazer oito anos de idade, surpreendentemente, quando visitava a casa de um tio. Lá me perdia por horas entre países e imagens na revista de capa amarela, a National Geographic.
Para minha diversão, o tio Luis, tinha uma coleção delas quase que infinita.
O encanto de ir ao encontro do desconhecido ali germinava. Conforme folheava as páginas de lugares tão distantes e diferentes do meu – na época morava no meio da Amazônia, numa terra encantada chamada Santarém – o exterior me aguçava e consequentemente, me chamava em cada imagem e naquelas palavras que mal entendia seus verdadeiros significados.
Buscando o inusitado
Nesse deleite, ora o fascínio nas páginas com mulheres-girafas de argolas enormes no pescoço lá da Tailândia, ora cruzava os olhos em cidades estranhas de arranha-céus – Hong Kong talvez; ou penetrava na cor de mar azul-esverdeado na Polinésia Francesa;por outro lado, em outros exemplares, caminhava com os dedos dentro de uma floresta africana bem distinta da minha. Igualmente, observava os traços das raças e meu universo se expandia.
O lugar desconhecido nos incita a imaginação e às vezes nos leva a acreditar que pode ser um paradeiro melhor que o nosso. O que tanto queremos descobrir lá fora?
Fui crescendo e ainda menina, numa das minhas primeiras viagens de avião dentro do Brasil, observara numa poltrona próxima, uma gringa de cabelos loiros que falava inglês.
Ela vestia roupas diferentes e eu não tirava o olhar do relógio colorido no pulso dela, parecia um daqueles da marca suiça: Swatch.
Na minha cabeça pequenina aquele era o relógio mais lindo que acabara de conhecer. Imaginava que ela, a turista, levava uma vida mais divertida que a minha, assim também, conhecia um mundo vasto que eu almejava.
E a gente vai crescendo, o tempo vai nos guiando e à vista disso, fazemos escolhas de acordo com o que acreditamos no nosso íntimo. Morei fora da minha cidade encantada muitas vezes dentro e fora do Brasil. Procurando outras belezas e entusiasmos – buscando o tal do inusitado.
Escolhi ou o Oriente me escolheu?
Posteriormente, um pedido de casamento aconteceu seguido de uma viagem (sem volta) de mala e cuia ao desconhecido. Bahrain? Onde fica mesmo? Perguntei ao meu marido oito meses antes de nos mudarmos de vez para o Golfo Pérsico. Sou expatriada pela terceira vez. Atualmente, tenho vivido no Golfo Pérsico o mesmo tempo que na cidade onde cresci.
Frequentemente, esse sentimento de não pertencer a um só lugar, me acompanha. Quando crescia no Pará não me sentia totalmente de lá, faltava um pedaço meu que tinha ficado no Ceará, onde nasci e morei por alguns anos na juventude.
Logo depois, mudei para outros lugares dentro do Brasil e essa história continuava, me sentia alheia dentro do meu próprio país.
Em outras palavras, não tenho dúvida que todas essas mudanças me preparam para viver essa estrangeirice mais completa no exterior e lá se foram períodos no Canadá (na parte francesa), Bahrain e Emirados Árabes.
Moro fora e dentro de mim
Hoje vivo com um mundaréu de línguas, sotaques e sabores de comidas dentro de mim que vão desde um exótico tacacá paraense até um popular shish taouk (grelhado de frango) em Dubai.
Simultaneamente, uma salada feita com palavras se misturam e me rodeiam mesmo que às vezes em silêncio. Por exemplo: paidégua, vixi Maria, thank you, alaikum salam e j’ai compris.
No final do dia, independente da naturalidade ou nacionalidade de cada um, somos todos habitantes de um mesmo planeta lindo e azul, chamado Terra.
Nesse sentido, posso dizer que, antes de dormir com a cabeça no travesseiro o que um paraense ou um árabe sonha e deseja é basicamente o mesmo: ser feliz, amar e ser amado.
Por fim, continuo seguindo com meu coração inquieto de expatriada até um dia retornar à pátria tão amada. Enquanto isso moro fora e dentro de mim.
“esta vida é uma viagem
pena eu estar
só de passagem”
Haicai de Paulo Leminsk
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Como é morar em Dubai. Saiba mais.
Passou pelo Canadá e Bahrein antes de firmar residência em Dubai, nos Emirados Árabes Unidos.
Escreve também literatura infantil, haicais e contos. É autora do “O Jardim da Lua” (finalista do Prêmio Jabuti 2022 na categoria ilustração) da editora Tigrito.
“Sarah & The Pink Dolphin” é seu primeiro livro bilíngue (inglês e árabe) publicado pela Nour Publishing.
Participou do Festival de Literatura da Emirates Airline em 2019 com o livro: “Pepa e Keca em Quem viu rimas por aí?”.
Atualmente cursa a pós-graduação “O livro para a Infância: processos de criação, circulação, mediação contemporâneos” na A Casa Tombada. É parceira do clube de assinatura de livros infantis, A Taba, nos Emirados.