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Viúva expatriada em Londres – Parte 2

Última atualização do post:

viúva expatriada em londres
Caixão com flores - Foto by Adrianna Geo on Unsplash

A morte inesperada de um dos cônjuges em território estrangeiro pode ser comparada a um tsunami, pois tira tudo do lugar. E não estou falando apenas de emoções, mas das praticidades do dia a dia mesmo. Estar viúva expatriada em Londres foi desafiador. Casa, mobília, veículos e documentos, entre outros, precisam de atenção imediata.

Como pagar os custos de translado do corpo?

Hoje eu sei que é preciso ter uma reserva financeira com essa finalidade, ou mesmo um seguro de vida. Nós não tínhamos, pois completaríamos dois anos como expatriados no dia 23 de junho e ainda estávamos nos organizando. Então um amigo sugeriu criar uma “vaquinha” online e pedir ajuda na internet. O site escolhido foi o Go Fund Me e, graças ao carisma do Claudio, que conquistou muitos amigos em tão pouco tempo, e a união da comunidade brasileira de Londres, o valor necessário foi arrecadado. O único problema era que teríamos que esperar quase um mês até que o dinheiro fosse depositado na conta indicada. Enquanto isso o que me salvou foi a generosidade dos amigos.

O que fazer com a casa ou o flat alugado?

O aluguel em Londres é muito caro, mesmo para um casal onde os dois trabalham em tempo integral, e não seria viável manter o flat, mesmo que por um mês apenas. Portanto, liguei para a agência e informei que teria de entregar o imóvel o mais rápido possível. Após algumas conversas, ficou decidido que eu indicaria uma pessoa para ocupar o imóvel, e que essa pessoa pagaria o valor do depósito para mim, já que a agência não podia devolver esse dinheiro porque eu estava quebrando o contrato que venceria somente em novembro. Mais uma vez os amigos me ajudaram.

O que fazer com os veículos?

O Claudio trabalhava de moto e eu de carro, ambos fazendo entrega. Vender a moto foi a decisão mais lógica, já que eu não sei pilotar. Optei por manter o carro até decidir o que eu faria da minha vida e, para não pagar as taxas obrigatórias Vehicle-Tax, preenchi um formulário informando que o veículo ficaria temporariamente fora das ruas (Statutory Off-Road Notification). Meu carro ficou estacionado na casa de um amigo por quase três meses e, no final, foi vendido, pois eu não tinha condições de renovar o seguro obrigatório.

Como emitir o atestado de óbito?

É preciso esperar o laudo médico para, depois, solicitar o atestado de óbito no Council (espécie de sub prefeitura) da região que você mora. O site do governo inglês NHS-UK diz que a autópsia leva de dois a três a dias. No entanto, nós só recebemos o laudo uma semana depois. Uma espera angustiante, que fez tudo parecer ainda pior, se é que era possível. O corpo só foi liberado no oitavo dia, quando a agência funerária iniciou o processo de preparação para o primeiro velório, em Londres, e o translado para o Brasil.

Como escolher a agência funerária?

Indicação de amigos é sempre o melhor caminho, especialmente para quem não fala inglês fluente, como era o meu caso. Nós usamos a Albin International – onde fui atendida por pessoas que falavam português e estavam realmente preparadas para tirar das minhas costas um peso que eu não tinha forças para carregar naquele momento. Eles embalsamaram o corpo e o pusseram em um caixão revestido de cobre, o que nos permitiu realizar mais dois velórios no Brasil. Tambem disponibilizaram uma sala para a realização de uma missa de corpo presente e cuidaram de toda a documentação necessária para a repatriação, incluindo o transporte aéreo.

viúva expatriada em londres
Caixão com flores – Foto by Adrianna Geo on Unsplash

Ficar em Londres ou voltar para o Brasil?

Enquanto resolvia todas essas questões acima eu ainda precisei pensar sobre o nosso futuro, meu e do meu filho. Meus pais e parentes no Brasil achavam melhor eu voltar para perto deles, enquanto meus amigos daqui explicavam as vantagens de continuar morando na Inglaterra. Para mim não fazia diferença pois, lá ou aqui, eu me sentia sozinha de uma forma que eu nunca imaginei que me sentiria.

É claro que a oferta de trabalho feita pela empresa onde o Claudio trabalhava e o benefício oferecido pelo Governo para os primeiros seis meses de viuvez contaram muitos pontos a favor da permanência. Mas, no final, quem me ajudou a decidir foi meu filho, então com 12 anos. Ele enumerou os pós e contras das duas opções e deixou claro que preferia continuar em Londres para terminar os estudos. Eu concordei com um porém: se no primeiro ano um de nós não conseguisse se readaptar, voltaríamos para o Brasil.

Como viver o luto e planejar o futuro ao mesmo tempo?

Segundo os estudiosos, o processo de luto passa por cinco fases: negação, raiva, depressão, negocição e aceitação. A ordem muda de pessoa para pessoa e depende muito da circunstância da morte. Uma mãe que perde o filho em um naufrágio e não tem a chance de se despedir, de ver o corpo e ter certeza da morte, pode passar o resto da vida na fase da negação. Isso não quer dizer que eu, mesmo tendo segurado a cabeça do meu marido morto no meu colo, realizado três velórios e ter sido a última a sair do cemitério no dia do enterro, tenha pulado essa fase.

Na verdade eu vivi todas elas numa espécie de rodízio no primeiro ano, enquanto buscava ajuda financeira do governo, tentava alugar um apartamento, trabalhava em três lugares diferentes para pagar as contas, me preocupava com o estado psicológico do meu filho, dividia casa com estranhos, bebia para esquecer e escrevia para aliviar.

E agora?

Como eu disse no começo, a morte não pede licença. Mas existe algo que até ela respeita: o tempo. Foi ele quem me ensinou que o momento certo para recomeçar não existe e que, apesar de ser impossível fugir da morte, continuar vivendo é a única maneira de honrar aqueles que amamos e partiram antes de nós.

Hoje, três anos depois daquela segunda-feira inesquecível, posso dizer que estou levando uma vida praticamente normal novamente. Tenho um bom trabalho, sou catequista na comunidade católica brasileira, comprei outro carro, aumentei minha rede de amigos e estou namorando.

Ainda penso muito no Claudio e sei que vou pensar enquanto eu viver. Mas o sentimento de abandono e tristeza, aos poucos, deram lugar a uma saudade gostosa, cheia de gratidão. Ele me trouxe até aqui, agora é comigo.

Para mais textos da autora cliquem aqui

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Isabel Brambilla

Sou paranaense, expatriada em Londres desde 2016. Bahcarel em Turismo por formacão, administradora de profissão e escritora por amor. Apaixonada por livros, viagens, fotografia, artesanato, jardinagem e camping. Mãe orgulhosa de um adolescente e namorada de um verdadeiro lord inglês, com quem estou descobrindo a ilha da Rainha. Para acompanhar minhas aventuras pela Inglaterra me sigam no Instagram.

4 respostas

  1. Estava esperandoo rs ! Apesar de triste, pelo acontecido ,achei interessante, gostei do diário, tem parte 3? 😁 👏👏👏👏👏

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